Falar de castelos antes de mais é falar de antigas estruturas militares que de tão presentes no nosso quotidiano se tornaram quase invisíveis aos olhos de quem por elas passa. Só nos lembramos das suas histórias quando paramos e olhamos mais atentamente para a sua imponência, nessa altura sim, verificamos que estamos na presença de algo maior, algo que pouco ou nada tem a ver com os contos de fadas com que geralmente os associamos e que de facto merece uma reflecção mais atenta e profunda, depois de um exercício de concentração conseguimos recuar no tempo e colocar nos seus lugares as personagens que deles fizeram parte e que assim, de certo modo construíram a história dos países tal como hoje os conhecemos. Nesta serie que vou dedicar aos castelos, vou tentar retratar de uma forma humilde honesta e equilibrada mas também com muito rigor histórico fruto de algum trabalho e pesquisa, a importância destes dinossauros da arquitetura medieval, nesses tempos idos e no seu atual valor para o desenvolvimento turístico das populações em seu redor…Comecemos então por um dos Castelos mais emblemáticos do País visto estar diretamente associado ao inicio da Nação, o Castelo de Guimarães, muito embora todos os outros Castelos que se lhe seguem e dos quais tenciono falar, também tenham sido como veremos mais a frente, muito importantes na defesa e consolidação deste retângulo de terra a beira-mar plantado…
O castelo de Guimarães é sem sombra de duvida o símbolo da nacionalidade portuguesa, não poderia portanto deixar de falar de forma especial deste belo e altivo castelo construído com tanta arte, sabedoria e magnificência. Integrado decerto na corrente de nobres atraídos ao ocidente peninsular pelas vicissitudes da Reconquista Cristã, um rico homem credivelmente de ascendência castelhana, Diogo Fernandes, veio nos fins do século IX estabelecer-se na região vimaranense, então no início de um promissor desenvolvimento. Com ele vieram a mulher e a prole, o filho e as três filhas. Entre estas, contava-se uma, de nome Mummadona, que haveria de notabilizar-se, não só por do seu casamento com Hermenegildo Gonçalves se ter originado uma dinastia Condal que governou, desde meados do século X até ao terceiro quartel do XI, a já chamada terra portucalense, núcleo do futuro Portugal, mas também pelo seu devoto gosto pelo progresso e à defesa da incipiente Guimarães, então repartida em dois modestos núcleos populacionais, um no alto do Monte Largo – alpis latitus no latim dos documentos da época – e o formado no sopé dessa colina. Tendo enviuvado antes do ano 928, Mummadona viu-se senhora de vastíssimos bens, que em Julho de 950 partilhou com os seus filhos – cinco homens e uma mulher – para logo a seguir, animada de viva religiosidade, mandar fundar na vila baixa um mosteiro, ao qual, nove anos depois, em Janeiro de 959, fez uma amplíssima doação de terras, gado, rendimento, ricos ornamentos de culto e livros religiosos. Porém, naqueles tempos, não decorria tranquila a vida quotidiana no noroeste peninsular, em que se desenvolvia a progressiva Guimarães; além da ameaça permanente de possíveis investidas das hostes muçulmanas, ainda dominantes ao sul, eram sobretudo inquietantes os repetidos assalto dos chamados normandos, misto de guerreiros e piratas, que eram provenientes dos mares do norte da Europa, e abordavam em som de guerra as costas peninsulares ou subiam os cursos dos rios, e espalhavam por toda a parte sangue e ruínas, saqueando, matando e cativando, após o que, com maior ou menor demora, reembarcavam, embora não o fizessem incólumes.
Dos anos subsequentes ao daquela doação, algumas dessas incursões são conhecidas, além certamente de vários outros assaltos cuja escassa monta se apagou na memória das gentes, não deixando rasto na história. Uma dessas incursões, de muçulmanos ou normandos, sobreveio por aquelas vizinhanças, e o coração da piedosa dama foi tocado de profundo temor pela segurança do mosteiro a que era tão devotada. Então resolveu ela construir naquele Monte Largo, um castelo, onde a comunidade se acolhesse em ocasião de perigo. É bem conhecido e várias vezes citado o trecho da carta de doação desse castelo aos religiosos, lavrada em Dezembro de 968, da qual consta a referida decisão. Já nesse ano, e em anos seguintes por mais de uma vez, monges e monjas estariam de olhos postos no seu refúgio castelejo, e prestes a correrem para ele. Primeiro, porque justamente desde os alvores desse 968 largamente se espalharam pelas terras da Galiza, levando-as a ferro e fogo, os oito mil normandos do viking Gunderedo, que só muito mais tarde vieram a ser vencidos e expulsos; depois, porque em várias ocasiões andou a guerra pelo norte de Portugal, movida ora por muçulmanos, ora por normandos. Nomeadamente em 997, quando Mohâmede Abu-Amir o celebre Almançor, vindo de Cória, fez caminho pela Beira, veio ao Porto, e, como o seu fito era destruir Compostela, deve ter seguido, desde aquela cidade, pela estrada romana que a ligava a Braga, passando portanto a uns quinze quilómetros de Guimarães, em marcha bélica embora não agressiva. Mais perigosamente em 1010 ou 1016, uma horda normanda invadiu a região a sul do Minho e chegou às vizinhanças de Guimarães, pois assolou as terras da vizinha Vermoim, cujo castelo assaltou.
A evolução construtiva deste interessante castelo não é conhecida através de fontes históricas suficientemente esclarecedoras; e quase pode dizer-se que tudo quanto se tem apurado resulta de dados oferecidos pela própria construção, dados sobre os quais se apoiam as Possíveis hipóteses cronológicas. Tradicionalmente considerado moradia do Conde D. Henrique e berço do primeiro rei de Portugal, D. Afonso Henriques. Mais forte é porventura o facto de saber-se pela carta de doação duns campos em Guimarães, outorgada em 2 de Janeiro de 1121 pela condessa D. Teresa a certos franceses aí moradores, que esses campos ficavam junto do palácio da doadora, na denominada Rua dos Franceses; portanto nesta data, e evidentemente com anterioridade maior ou menor, a residência condal era na vila e não no castelo, admitindo que a anterioridade de tal residência não atingia os últimos anos da vida do Conde Henrique, falecido em 1112, e consequentemente o do nascimento de D. Afonso Henriques provavelmente em 1009, No decurso dos séculos XII a XIV, vários sucessos enaltecem a história militar deste castelo. Nele deve ter resistido o moço Afonso Henriques, quando em 1127, encontrando-se em Guimarães, ali veio mover-lhe guerra o rei de Leão, Afonso VII, seu primo, com o fito de reduzi-lo à vassalagem de que, já em luta com a mãe para obtenção do governo do condado Portucalense, pretendia libertar-se.
Já no tempo da crise dinástica que se seguiu ao falecimento de D. Fernando, as vicissitudes do castelo de Guimarães interferiram nas da Nação; e deste sucesso há conhecimento mais detalhado, porque a ele se referiu um tanto pormenorizadamente o cronista Fernão Lopes. Como tantos outros exemplos conhecidos na história, o castelo de Guimarães, conheceu ao longo do tempo o ocaso da sua gloriosa existência, pouco a pouco, no decurso dos séculos XVI a XIX o influxo dos tempos e a ignorância, juntamente com o desrespeito dos homens pelo seu legado histórico tanto lhe macularam a integridade, até que o restauro levado a cabo no século XX conseguiu restituir a essas muralhas e torres, onde ainda repercute o eco de épicas batalhas, toda a sua grandiosidade, e toda a sua severa e majestosa beleza.
Egas Moniz, o Aio, será isto uma lenda?
A batalha de Valdevez entre os exércitos de D. Afonso Henriques e Afonso VII de Castela não teve um resultado decisivo para nenhuma das hostes envolvidas. D. Afonso Henriques retirou-se para Guimarães com o seu aio Egas Moniz e com os outros chefes das cinco famílias mais importantes do Condado Portucalense, interessadas na independência. O monarca Castelhano pôs cerco ao castelo de Guimarães mas o futuro rei de Portugal preferia morrer a render-se ao primo. Egas Moniz, fundamentado na autoridade que a posição e a idade lhe conferiam, decidiu negociar a paz com Afonso VII a troco da vassalagem de D. Afonso Henriques e dos nobres que o apoiavam. O rei castelhano aceitou a palavra de Egas Moniz de que D. Afonso Henriques cumpriria o voto de vassalagem. Mas um ano depois, D. Afonso Henriques quebrou o prometido e resolveu invadir a Galiza, dando origem a um dos momentos mais heroicos da nossa história. Vestidos de condenados, Egas Moniz apresentou-se com toda a sua família na côrte de D. Afonso VII, em Castela, pondo nas mãos do rei as suas vidas como penhor da promessa quebrada. O rei castelhano, diante da coragem e humildade de Egas Moniz, decidiu perdoar-lhe e presenteou-o com favores. Este ato heroico impressionou também D. Afonso Henriques, que concedeu ao seu velho aio extensos domínios. Pensa-se que esta terá sido uma estratégia inteligente por parte de Egas Moniz para que o primeiro rei de Portugal pudesse ganhar tempo. Ao entregar-se, Egas Moniz ressalvava a sua honra e também a de Afonso Henriques, assegurando através da sua astúcia a futura independência de Portugal.
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